Agora
-
-
Unesp FM ao vivo

Programa 7: Rui Veloso, Sérgio Godinho, Luís Represas e Jorge Palma (Letras)

 



Acima, a chamada para o Programa 7.



 



1) Porto Covo (Rui Veloso)



Carlos Tê / Rui Veloso



 



Roendo uma laranja na falésia



Olhando o mundo azul à minha frente



Ouvindo um rouxinol na redondeza



No calmo improviso do poente



 



Em baixo fogos trémulos nas tendas



Ao largo as águas brilham como prata



E a brisa vai contando velhas lendas



De portos e baías de piratas



 



Havia um pessegueiro na ilha



Plantado por um Vizir de Odemira



Que dizem que por amor se matou novo



Aqui, no lugar de Porto Côvo



 



A lua já desceu sobre esta paz



E reina sobre todo este luzeiro



Á volta toda a vida se compraz



Enquanto um sargo assa no brazeiro



 



Ao longe a cidadela de um navio



Acende-se no mar como um desejo



Por trás de mim o bafo do destino



Devolve-me à lembrança do Alentejo



 



Havia um pessegueiro na ilha



Plantado por um Vizir de Odemira



Que dizem que por amor se matou novo



Aqui, no lugar de Porto Côvo



 



Roendo uma laranja na falésia



Olhando à minha frente o azul escuro



Podia ser um peixe na maré



Nadando sem passado nem futuro



 



Havia um pessegueiro na ilha



Plantado por um Vizir de Odemira



Que dizem que por amor se matou novo



Aqui, no lugar de Porto Côvo



 



 



2) Paixão (Anel de Rubi) (Rui Veloso)



Carlos Tê / Rui Veloso



 



Tu eras aquela que eu mais queria



Para me dar algum conforto e companhia



Era só contigo que eu sonhava andar



Para todo o lado e até quem sabe talvez casar



 



Ai o que eu passei só por te amar



A saliva que eu gastei para te mudar



Mas esse teu mundo era mais forte do que eu



E nem com a força da música ele se moveu



 



Mesmo sabendo que não gostavas



Empenhei o meu anel de rubi



P'ra te levar ao concerto que havia no Rivoli



 



E era só a ti, que eu mais queria



Ao meu lado no concerto nesse dia



Juntos no escuro de mão dada a ouvir



Aquela música maluca sempre a subir



Mas tu não ficaste nem meia hora



Não fizeste um esforço p'ra gostar e foste embora



 



Contigo aprendi uma grande lição



Não se ama alguém que não ouve a mesma canção



 



Mesmo sabendo que não gostavas



Empenhei o meu anel de rubi



P'ra te levar ao concerto que havia no Rivoli



 



Foi nesse dia que percebi



Nada mais por nós havia a fazer



A minha paixão por ti, era um lume



Que não tinha mais lenha por onde arder



 



Mesmo sabendo que não gostavas



Empenhei o meu anel de rubi



P'ra te levar ao concerto que havia no Rivoli



 



 



3) Jura (Rui Veloso)



Carlos Tê / Rui Veloso



 



Jura que não vais ter uma aventura



Dessas que acontecem numa altura



E depois se desvanecem



Sem lembrança boa ou má



E por isso mesmo se esquecem



 



Jura que se tiveres uma aventura



Vais contar uma mentira



Com cuidado e com ternura



Vais fazer uma pintura



Com uma tinta qualquer



Que o ciúme é queimadura



Que faz o coração sofrer



 



Jura que não vais ter uma aventura



Porque eu hei-de estar sempre à altura



De saber



Que a solidão é dura



E o amor é uma fervura



Que a saudade não segura



E a razão não serena



Mas jura que se tiver de ser



Ao menos que valha a pena



 



 



4) Todo o tempo do mundo (Rui Veloso)



Carlos Tê / Rui Veloso



 



Podes vir a qualquer hora



Cá estarei para te ouvir



O que tenho para fazer



Posso fazer a seguir



 



Podes vir quando quiseres



Já fui onde tinha de ir



Resolvi os compromissos



agora só te quero ouvir



 



Podes-me interromper



e contar a tua história



Do dia que aconteceu



A tua pequena glória



O teu pequeno troféu



 



Todo o tempo do mundo



para ti tenho todo o tempo do mundo



Todo o tempo do mundo



 



Houve um tempo em que julguei



Que o valor do que fazia



Era tal que se eu parasse



o mundo à volta ruía



 



E tu vinhas e falavas



falavas e eu não ouvia



E depois já nem falavas



E eu já mal te conhecia



 



Agora em tudo o que faço



O tempo é tão relativo



Podes vir por um abraço



Podes vir sem ter motivo



Tens em mim o teu espaço



 



Todo o tempo do mundo



para ti tenho todo o tempo do mundo



Todo o tempo do mundo



 



 



5) Nunca me esqueci de ti (Rui Veloso)



João Monge / Rui Veloso



 



Bato a porta devagar,



Olho só mais uma vez



Como é tão bonita esta avenida...



É o cais. Flor do cais:



Águas mansas e a nudez



Frágil como as asas de uma vida



 



É o riso, é a lágrima



A expressão incontrolada



Não podia ser de outra maneira



É a sorte, é a sina



Uma mão cheia de nada



E o mundo à cabeceira



 



Mas nunca



Me esqueci de ti



Não nunca me esqueci de ti



Eu nunca me esqueci de ti



Não nunca me esqueci de ti



 



Tudo muda, tudo parte



Tudo tem o seu avesso.



Frágil a memória da paixão...



É a lua. Fim da tarde



É a brisa onde adormeço



Quente como a tua mão



 



Mas nunca



Me esqueci de ti



Não, nunca me esqueci de ti



Não, nunca me esqueci de ti



Eu nunca me esqueci de ti



 



Nunca me esqueci de ti



Não não não não não nunca me esqueci de ti



 



Não não não não não não não não



Nunca me esqueci de ti



Não não



Nunca me esqueci de ti...



 



 



6) Com um brilhozinho nos olhos (Sérgio Godinho)



Sérgio Godinho / Nuno Rafael



 



Com um brilhozinho nos olhos



E a saia rodada



Escancaraste a porta do bar



Trazias o cabelo aos ombros



Passeando de cá para lá



Como as ondas do mar



Conheço tão bem esses olhos



E nunca me enganam



O que é que aconteceu diz lá



É que hoje fiz um amigo



E coisa mais preciosa no mundo não há



É que hoje fiz um amigo



E coisa mais preciosa no mundo não há



 



Com um brilhozinho nos olhos



Metemos o carro



Muito à frente muito à frente dos bois



Ou seja fizemos promessas



Trocámos retratos



Traçámos projectos a dois



Trocámos de roupa trocámos de corpo



Trocámos de beijos tão bom é tão bom



E com um brilhozinho nos olhos



Tocámos guitarras



Pelo menos a julgar pelo som



E com um brilhozinho nos olhos



Tocámos guitarras



Pelo menos a julgar pelo som



 



E o que é que foi que ele disse?



E o que é que foi que ele disse?



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



 



Passa aí mais um bocadinho



Que estou quase a ficar louco



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Portanto



Hoje soube-me a pouco



 



Com um brilhozinho nos olhos



Corremos os estores



Pusemos a rádio no on



Acendemos a já costumeira



Velinha de igreja



Pusemos no off o telefone



E olha não dá para contar



Mas sei que tu sabes



Daquilo que sabes que eu sei



E com um brilhozinho nos olhos



Ficámos parados



Depois do que não te contei



E com um brilhozinho nos olhos



Ficámos parados



Depois do que não te contei



 



Com um brilhozinho nos olhos



Dissemos sei lá



Tudo o que nos passou pela tola



Do estilo: és o number one



Dou-te vinte valores



És um treze no totobola



E às duas por três



Bebemos um copo



Fizemos o quatro e pintámos o sete



E com um brilhozinho nos olhos



Ficámos imoveis



A dar uma de tête a tête



E com um brilhozinho nos olhos



Ficámos imoveis



A dar uma de tête a tête



 



E o que é que foi que ele disse?



E o que é que foi que ele disse?



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



 



Passa aí mais um bocadinho



Que estou quase a ficar louco



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Portanto



Hoje soube-me a pouco



 



E com um brilhozinho nos olhos



Tentámos saber



Para lá do que muito se amou



Quem eramos nós



Quem queriamos ser



E quais as esperanças



Que a vida roubou



E olhei-o de longe



E mirei-o de perto



Que quem não vê caras



Não vê corações



E com um brilhozinho nos olhos



Guardei um amigo



Que é coisa que vale milhões



E com um brilhozinho nos olhos



Guardei um amigo



Que é coisa que vale milhões



 



E o que é que foi que ele disse?



E o que é que foi que ele disse?



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



Hoje soube-me a pouco



 



Passa aí mais um bocadinho



Que estou quase a ficar louco



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Hoje soube-me a tanto



Portanto



Hoje soube-me a pouco



 



 



7) É terça-feira (Sérgio Godinho)



Sérgio Godinho



 



É terça-feira



e a feira da ladra



abre hoje às cinco



de madrugada



 



E a rapariga



desce a escada quatro a quatro



vai vender mágoas



ao desbarato vai vender



juras falsas, amargura



ilusões, trapos e cacos e contradições



 



É terça-feira



e das cinzas talvez



amanhã que é quarta-feira



haja fogo outra vez



o coração é incapaz de dizer "tanto faz"



parte p´ra guerra



com os olhos na paz



 



É terça-feira



e a feira da ladra



quase transborda



de abarrotada



 



E a rapariga



vende tudo o que trazia



troca a tristeza



pela alegria



 



E todos querem



Regateiam amarguras



Ilusões, trapos e cacos e contradições



 



É terça-feira



e das cinzas talvez



amanhã que é quarta-feira



haja fogo outra vez



o coração é incapaz



de dizer "tanto faz"



parte p´ra guerra



com os olhos na paz



 



É terça-feira



e a feira da ladra



fica enfim quieta



e abandonada



e a rapariga



deixou no chão um lamento



que se ergue e gira



e roda com o vento



e rodopia e navega



e joga à cabra-cega



é de nós todos



e a ninguém se entrega



 



É terça-feira



e das cinzas talvez



amanhã que é quarta-feira



haja fogo outra vez



o coração é incapaz



de dizer "tanto faz"



parte p´ra guerra



com os olhos na paz



 



 



8) Feiticeira (Luís Represas, com Pablo Milanés)



Francisco Viana / Luís Represas



 



De que noite demorada



Ou de que breve manhã



Vieste tu, feiticeira



De nuvens deslumbrada



 



De que sonho feito mar



Ou de que mar não sonhado



Vieste tu, feiticeira



Aninhar-te ao meu lado



 



De que fogo renascido



Ou de que lume apagado



Vieste tu, feiticeira



Segredar-me ao ouvido



 



De que fontes de que águas



De que chão de que horizonte



De que neves de que fráguas



De que sedes de que montes



De que norte de que lida



De que deserto de morte



Vieste tu feiticeira



Inundar-me de vida.



 



 



9) Perdidamente (Luís Represas)



Florbela Espanca; João Gil



 



Ser poeta é ser mais alto, é ser maior



Do que os homens! Morder como quem beija!



É ser mendigo e dar como quem seja



Rei do Reino de Áquem e de Além Dor!



 



É ter de mil desejos o esplendor



E não saber sequer que se deseja!



É ter cá dentro um astro que flameja,



É ter garras e asas de condor!



 



É ter fome, é ter sede de Infinito!



Por elmo, as manhas de oiro e de cetim...



É condensar o mundo num só grito!



 



E é amar-te, assim, perdidamente...



É seres alma, e sangue, e vida em mim



E dizê-lo cantando a toda a gente!



 



 



10) Canção de Lisboa (Jorge Palma)



Jorge Palma



 



Os serões habituais



As conversas sempre iguais



Os horóscopos, os signos e ascendentes



Mais a vida da outra sussurrada entre os dentes



Os convites nos olhos embriagados



Os encontros de novo adiados



Nos ouvidos cansados ecoa



A canção de Lisboa



 



Não está só a solidão



Há tristeza e compaixão



Quando sono acalma os corpos agitados



Pela noite atirados contra colções errados



Há o silêncio de quem não ri nem chora



Há divórcio entre o dentro e o fora



E há quem diga que nunca foi boa



A canção de Lisboa



 



Mamã, mamã



Onde estás tu mamã



Nós sem ti não sabemos mamã



Libertar-nos do mal



 



A urgência de agarrar



Qualquer coisa para mostrar



Que afinal nos também temos mão na vida



Mesmo que seja a custa de a vivermos fingida



O estatuto para impressionar o mundo



Não precisa de ser mais profundo



Que o marasmo que nos atordoa



Ó canção de Lisboa



 



As vielas de néon



As guitarras já sem som



Vão mantendo viva a tradição da fome



Que a memória deturpa e o orgulho consome



Entre o orgasmo e a gruta ainda fria



O abandonado da carne vazia



Cada um no seu canto entoa



A canção de Lisboa



 



 



11) Encosta-te a mim (Jorge Palma)



Jorge Palma



 



Encosta-te a mim



Nós já vivemos cem mil anos



Encosta-te a mim



Talvez eu esteja a exagerar



Encosta-te a mim



Dá cabo dos teus desenganos



Não queiras ver quem eu não sou



Deixa-me chegar



 



Chegado da guerra



Fiz tudo pra sobreviver, em nome da terra



No fundo pra te merecer



Recebe-me bem



Não desencantes os meus passos



Faz de mim o teu herói



Não quero adormecer



 



Tudo o que eu vi



Estou a partilhar contigo



O que não vivi, hei de inventar contigo



Sei que não sei



Às vezes entender o teu olhar



Mas quero-te bem



Encosta-te a mim



 



Encosta-te a mim



Desatinamos tantas vezes



Vizinha de mim



Deixa ser meu o teu quintal



Recebe esta pomba que não está armadilhada



Foi comprada, foi roubada, seja como for



 



Eu venho do nada



Porque arrasei o que não quis



Em nome da estrada, onde só quero ser feliz



Enrosca-te a mim



Vai desarmar a flor queimada



Vai beijar o homem-bomba, quero adormecer



 



Tudo o que eu vi



Estou a partilhar contigo, e o que não vivi



Um dia hei de inventar contigo



Sei que não sei, às vezes entender o teu olhar



Mas quero-te bem



 



Encosta-te a mim



Encosta-te a mim



Quero-te bem



Encosta-te a mim


Áudio