Acima, a chamada para o Programa 7.
Pesquisa: Maria Júlia Franco de Souza e Beatriz Macedo Souza
1) Sou do fado, sou fadista
Autores: Jorge Fernando
Sei que a alma se ajeitou
Tomou a voz nas mãos
Rodopiou no peito
E fez-se ouvir no ar
E eu fechei meus olhos
Tristes só por querer
Cantar, cantar
E uma voz me canta assim baixinho
E uma voz me encanta assim baixinho
Sou do fado
Sou do fado
Eu sou fadista
Sei que o ser se dá assim
Às margens onde o canto
Recolhe em seu regaço
As almas num só fado
E eu prendi-me a voz
Como a guitarra ao seu
Trinado, trinado
E uma voz me canta assim baixinho
E uma voz me encanta assim baixinho
Sou do fado
Sou do fado
Eu sou fadista
2) Por um dia
Autor: Jorge Fernando
Perguntares como é que eu estou não é quanto baste
Quereres saber a quem me dou não é quanto baste
E dizeres para ti morri é um estranho contraste
Nada mais te liga a mim tu nunca me amaste
Telefonas para saber como vai a vida
E mais feres sem querer minha alma ferida
E assim rola a minha dor pássaro ferido
Que não esquece o teu amor estranho e proibido
Deixa-me só por um dia
Deixa-me só por um dia
Minha fria companhia
Minha fria companhia
Dizes ser tão actual ficarmos amigos
No teu jeito natural de enfrentar os perigos
Sem saberes que tanto em mim ainda arde a chama
Que não perde o seu fulgor que ainda te ama
Deixa-me só por um dia
Deixa-me só por um dia
Minha fria companhia
Minha fria companhia
Minha fria companhia
3) O que foi que aconteceu
Autor: Tozé Brito
Aconteceu, eu não estava à tua espera
E tu não me procuravas, nem sabias quem eu era
Eu estava ali só porque tinha que estar
E tu chegaste porque tinhas que chegar
Olhei para ti, o mundo inteiro parou
Nesse instante a minha vida, a minha vida mudou
Tudo era para ser eterno, e tu para sempre meu
Onde foi que nos perdemos? O que foi que aconteceu?
Tudo era para ser eterno e tu para sempre meu
Onde foi que nos perdemos, meu amor? O que foi que aconteceu?
Aconteceu, chama-lhe sorte ou azar
Eu não estava à tua espera, e tu voltaste a passar
Nunca senti bater o meu coração, como senti ao sentir a tua mão
Na tua boca o tempo voltou atrás, E se fui louca, essa loucura, essa loucura foi paz
Tudo era para ser eterno, e tu para sempre meu
Onde foi que nos perdemos? O que foi que aconteceu?
Tudo era para ser eterno, e tu para sempre meu
Onde foi que nos perdemos, meu amor? O que foi que aconteceu?
4) Os búzios
Autor: Jorge Fernando
Havia a solidão da prece no olhar triste
Como se os seus olhos fossem as portas do pranto
Sinal da cruz que persiste, os dedos contra o quebranto
E os búzios que a velha lançava sobre um velho manto
À espreita está um grande amor mas guarda segredo
Vazio tens o teu coração na ponta do medo
Vê como os búzios caíram virados pra norte
Pois eu vou mexer o destino, vou mudar-te a sorte
Havia um desespero intenso na sua voz
O quarto cheirava a incenso, mais uns quantos pós
A velha agitava o lenço, dobrou-o, deu-lhe 2 nós
E o seu pai de santo falou usando-lhe a voz
À espreita está um grande amor mas guarda segredo
Vazio tens o teu coração na ponta do medo
Vê como os búzios caíram virados pra norte
Pois eu vou mexer o destino, vou mudar-te a sorte!
5) O fado da procura
Autor: Amélia Muge
Mas porque é que a gente
Não se encontra?
No Largo da Bica fui-te procurar
Campo de Cebolas, e eu sem te encontrar
Eu fui mesmo até à Casa do Fado
Mas tu não estavas Em nenhum lado
Mas porque é que a gente
Não se encontra?
Mas porque é que a gente
Não se encontra?
Já estou sem saber o que hei-de fazer
Se seguir em frente, Ai, Madre de Deus
Se voltar atrás, Ai, Chiados meus
E o rio diz: “- Que tarde infeliz”
Mas porque é que a gente
Não se encontra?
Mas porque é que a gente
Não se encontra?
Já estou farta disto, farta de verdade
Vou beber a bica, sentar e pensar
Ver se esta saudade, ai, fica ou não fica
E talvez sem querer, não querem lá ver
Sem te procurar te veja passar
Sem te procurar te veja passar
6) Leva-me aos fados
Autor: Jorge Fernando
Chegaste a horas
Como é costume
Bebe um café
Que eu desabafo o meu queixume
Na minha vida
Nada dá certo
Mais um amor
Que de findar me está tão perto
Leva-me aos fados
Onde eu sossego
As desventuras do amor a que me entrego
Leva-me aos fados
Que eu vou perder-me
Nas velhas quadras
Que parecem conhecer-me
Dá-me um conselho
Que o teu bom senso
É o aconchego de que há tempos não dispenso
Caí de novo, mas quero erguer-me
Olhar-me ao espelho e tentar reconhecer-me
7) De quando em vez
Autores: Mário Raínho / João Maria dos Anjos
De quando em vez lá te entregas
nesse sim, em que te negas
ou nesse não, que me é tanto
Não te pergunto os porquês
deste amar, de quando em vez
ou talvez de vez em quando
Quase sempre de fugida
como criança escondida
nosso amor brinca com o fogo
Se queremos dizer adeus
porque dizemos meu Deus
simplesmente um até logo
E o enleio continua
à mercê de qualquer lua
que nos comanda os sentidos
E a paixão que não tem siso
deixa-nos sem pré-aviso
de corpo e alma despidos
Por teimosia, ou loucura
algemamos a ventura
do amor, em nós, reencarnando
Prefiro, como tu vês
amar-te de quando em vez
ou talvez de vez em quando
8) Desfado
Autor: Pedro da Silva Martins
Quer o destino que eu não creia no destino
E o meu fado é nem ter fado nenhum
Cantá-lo bem sem sequer o ter sentido
Senti-lo como ninguém, mas não ter sentido algum
Ai que tristeza, esta minha alegria
Ai que alegria, esta tão grande tristeza
Esperar que um dia eu não espere mais um dia
Por aquele que nunca vem e que aqui esteve presente
Ai que saudade
Que eu tenho de ter saudade
Saudades de ter alguém
Que aqui está e não existe
Sentir-me triste
Só por me sentir tão bem
E alegre sentir-me bem
Só por eu andar tão triste
Ai se eu pudesse não cantar "ai se eu pudesse"
E lamentasse não ter mais nenhum lamento
Talvez ouvisse no silêncio que fizesse
Uma voz que fosse minha cantar alguém cá dentro
Ai que desgraça esta sorte que me assiste
Ai mas que sorte eu viver tão desgraçada
Na incerteza que nada mais certo existe
Além da grande certeza de não estar certa de nada
9) A fadista
Autores: Pedro Rodrigues / Manuela de Freitas
Vestido negro cingido
Cabelo negro comprido
E negro xaile bordado
Subindo à noite a Avenida
Quem passa julga-a perdida
Mulher de vício e pecado
E vai sendo confundida
Insultada e perseguida
Pelo convite costumado
Entra no café cantante
Seguida em tom provocante
Pelos que querem comprá-la
Uma guitarra a trinar
Uma sombra devagar
Avança para o meio da sala
Ela começa a cantar
E os que a queriam comprar
Sentam-se à mesa a olhá-la
Canto antigo e tão profundo
Que vindo do fim do mundo
É prece, pranto ou pregão
E todos os que a ouviam
À luz das velas pareciam
Devotos em oração
E os que há pouco a ofendiam
De olhos fechado ouviam
Como a pedir-lhe perdão
Vestido negro cingido
Cabelo negro comprido
E negro xaile traçado
Cantando pra aquela mesa
Ela dá-lhes a certeza
De já lhes ter perdoado
E em frente dela na mesa
Como em prece a uma deusa
Em silêncio ouve-se o fado
10) Fado alado – Ana Moura
Autor: Pedro Abrunhosa
Vou de Lisboa a São Bento, trago o teu mundo por dentro
No lenço que tu me deste
Vou do Algarve ao Nordeste, trago o teu beijo bordado
Sou um comboio de fado
Levo um amor encantado, sou um comboio de gente
Sou o chão do Alentejo, de ferro é o meu beijo
Tão quente como a liberdade
E se não trago saudade, é porque vives deitado
Num amor que não está parado
Sou um comboio de fado, sou um comboio de gente
Não há amor com mais tamanho, que este amor por ti eu tenho
Voo de pássaro redondo, que não aporta no beiral
Não há amor que mais me leve, que aquele em que se escreve
Ai... lume brando, paz e fogo
E a luz final
Desço do Porto ao Rossio, levo o abraço do rio
Douro, amante do Tejo
Nos ecos dum realejo, chora minha guitarra
Trazes-me a paz da cigarra, num desencontro encontrado
Sou um comboio de fado
Se for morrer a Coimbra, traz-me da luz a penumbra
Do amor que nunca se fez
Corre-me o sangue de Inês, mostra-me um sonho acordado
Somos um povo alado, um povo que vive no fado
A alma de ser diferente
11) Despiu a saudade – Ana Moura
Autores: António Zambujo / Paulo Abreu de Lima
Despiu a saudade depois do jantar
Num prato já frio de tanto esperar
Aquele que bebe nos tascos da vida
Rodadas de amantes de tara perdida
E chega tão cheio de nada pra dar
Sacudiu o pó desse amor primeiro
Num canto guardado do seu coração
Aquele retrato parado no tempo
Que morde por fora, magoa por dentro
Num corpo vazio de tanta ilusão
Mas de repente como um sol depois da chuva
Surgiu a noite transformada em alvorada
Vai pró espelho, faz-se bonita
Lábios vermelhos, corpo de chita
Vestido na pressa de quem sai já atrasada
Brilho nos olhos, ar de menina
Livre e rainha, de tresloucada
Saltou pra lua, na minha rua na madrugada
Trago o coração à flor da boca
E a sina escrita na palma da mão
Foram tantos anos sem imaginar
O dia sonhado da noite mais louca
Nas ruas da vida com ela a dançar
Despiu a saudade
Sacudiu o pó
12) Dia de folga – Ana Moura
Autor: Jorge Cruz
Manhã na minha ruela, sol pela janela
O senhor jeitoso dá tréguas ao berbequim
O galo descansa, ri-se a criança
Hoje não há birras, a tudo diz que sim
O casal em guerra do segundo andar
Fez as pazes, está lá fora a namorar
Cada dia é um bico d’obra
Uma carga de trabalhos faz-nos falta renovar
Baterias, há razões de sobra
Para celebrarmos hoje com um fado que se empolga
É dia de folga!
Sem pressa de ar invencível, saia, saltos, rímel
Vou descer à rua, pode o trânsito parar
O guarda desfruta, a fiscal não multa
Passo e o turista, faz por não atrapalhar
Dona Laura hoje vai ler o jornal
Na cozinha está o esposo de avental
Refrão
Folga de ser-se quem se é
E de fazer tudo porque tem que ser
Folga para ao menos uma vez
A vida ser como nos apetecer
Cada dia é um bico d’obra
Uma carga de trabalhos, faz-nos falta renovar
Baterias, há razões de sobra
Para a tristeza ir de volta e o fado celebrar
Refrão
Este é o fado que se empolga
No dia de folga!
No dia de folga!
13) Moura Encantada (Moura)
Autores: Manuela de Freitas / Alfredo Marceneiro
É lenda, na Mouraria
Que grande riqueza havia
Por uma moura guardada
Um dia alguém perguntou-me
Se a moura que há no meu nome
É essa moura encantada
Não sei, só sei que me dou
E me esqueço de quem sou
Como num sono profundo
E nos sonhos que vou tendo
Eu adivinho e desvendo
Todos os sonhos do mundo
A minha voz, de repente
É a voz de toda a gente
De tudo o que a vida tem
Quando a noite chega ao fim
Vou à procura de mim
E não encontro ninguém
Não sei se é lenda ou se não
Se é encanto ou maldição
Que às vezes me pesa tanto
Sei que livre ou condenada
E sem pensar em mais nada
Eu fecho os olhos e canto
Serei talvez encantada
E sendo assim tudo e nada
Eu fecho os olhos e canto
14) Loucura – Ana Moura
Autores: Frederico de Brito / Júlio de Sousa
Sou do fado
Como eu sei
Vivo um poema cantado
Um fado que eu inventei
A falar não posso dar-me
Mas ponho a alma a cantar
E as almas sabem escutar-me
Chorai, chorai
Poetas do meu país
Troncos da mesma raiz
Da vida que nos juntou
E se vocês não estivessem a meu lado
Então não havia fado
Nem fadistas como eu sou
Nesta voz tão dolorida
É culpa de todos vós
Poetas da minha vida
É loucura ouço dizer
Mas bendita esta loucura
de cantar e de sofrer
Chorai, chorai
Poetas do meu país
Troncos da mesma raíz
Da vida que nos juntou
E se vocês não estivessem a meu lado
Então não havia fado
Nem fadistas como eu sou.
E se vocês não estivessem a meu lado
Então não havia fado
Nem fadistas como eu sou.