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Programa 11: António Zambujo - Letras

Acima, a chamada para o Programa 11.



 



Pesquisa: Maria Júlia Franco de Souza e Beatriz Macedo Souza



 



1) Terra da minha gente



        Autores: José Luis Gordo / Mário Rainho / António Zambujo



 



Ai terra da minha gente



Trigueira de solidão



A tua voz tão presente



Grita dos campos do pão



 



Mas grita como quem canta



Os silêncios do pastor



Quando a alma se agiganta



Morremos quase sem dor



 



Mas não morremos sozinhos



Nem chegamos a morrer



Que os cheiros dos teus caminhos



Nos obrigam a viver



 



A viver como quem molha



A boca seca num beijo



Ai terra que se desfolha



Ai pranto chão, alentejo!



 



2) O Sino da minha aldeia



        Autores: Fernando Pessoa / Popular (fado das horas)



 



Ó, sino da minha aldeia



Dolente na tarde calma



Cada tua badalada



Soa dentro da minha alma



 



E é tão lento o teu soar



Tão como triste da vida



Que já a primeira pancada



Tem o som de repetida



 



Por mais que me tanjas perto



Quando passo sempre errante



És para mim como um sonho



Soas-me na alma distante



 



A cada pancada tua



Vibrante no céu aberto



Sinto mais longe o passado



Sinto a saudade mais perto



 



3) Fadista louco



         Autor: Alberto Janes



 



Eu canto com os olhos bem fechados



Que o maestro dos meus fados



É quem lhes dá o condão



E assim não olho pra outros lados



Que canto de olhos fechados



Pra olhar pro coração.



 



Meu coração que é fadista de outras eras



Que sonha viver quimeras



Em loucura desabrida



Meu coração, se canto, quase me mata



Pois por cada vez que bata



Rouba um pouco a minha vida



 



Ele e eu, cá vamos sofrendo os dois



Talvez um dia, depois dele parar pouco a pouco



Talvez alguém se lembre ainda de nós



E sinta na minha voz o que sentiu este louco.



 



4) Não me dou longe de ti



       Autores: João Monge / Alfredo dos Santos



 



Não me dou longe de ti



Nem em sonhos eu consigo



Ter alguém no meio de nós



Só Deus sabe o que pedi



Para tu ficares comigo



E ouvires a sua voz



 



Só eu sei o que sofri



Quando sonhava contigo



E abria os olhos a sós



 



Sabes da minha fraqueza



Onde a faca tem dois gumes



Onde me mato por ti



É da tua natureza



Cortar-me o peito em ciúmes



E eu finjo que não morri



 



Mas é da minha tristeza



Esconder no fado os queixumes



E a cantar entristeci



 



À noite voltas de chita



Com duas flores no regaço



E tudo o que a Deus pedi



És tão minha, tão bonita



És a primeira que abraço



Aquela em que me perdi



 



Nem a minha alma acredita



Que me perco no teu passo



Não me dou longe de ti



 



Assim te quero guardar



Como se mais nada houvesse



Nem futuro, nem passado



De tanto, tanto te amar



Pedi a Deus que trouxesse



O teu corpo no meu fado



 



5) A casa fechada



Autores: João Monge / José Marques



 



Aquela casa fechada



Não tem vasos na entrada



Nem se vê luz de uma vela



Dizem que a casa está morta



Já ninguém lhe bate à porta



Nem se assoma na janela



 



Às vezes passam rapazes



Para mostrar que são capazes



Jogam pedras ao telhado



Esse lar que ninguém quer



Já foi de homem e mulher



Antes de ser condenado



 



Aquela casa fechada



Onde o sol tinha a morada



E entrava sem bater



Já foi estimada por ti



Noutros tempos que eu vivi



E não consigo esquecer



 



No dia em que tu partiste



A casa ficou tão triste



Desde aí que não a vejo



Fechei a porta da escada



Fiz uma cruz na entrada



E mandei a chave ao Tejo



 



6) Rua dos meus ciúmes



Autores: Nelson de Barros / Frederico Valério



 



Na rua dos meus ciúmes



Onde eu morei e tu moras



Vi-te passar fora de horas



Com a tua nova paixão



 



De mim não esperes queixumes



Quer seja desta ou daquela



Pois sinto só pena dela



E até lhe dou meu perdão



Na rua dos meus ciúmes



Deixei o meu coração



 



Ainda que me custe a vida



Pensarei com ar sereno



Que esse teu ombro moreno



Beijos de amor vão queimar



 



Saudades, são fé perdida



São folhas mortas ao vento



Que eu piso sem um lamento



Na tua rua, ao passar



Ainda que me custe a vida



Não hás-de ver-me chorar



 



7) Lambreta



       Autor: João Monge



 



Vem dar uma voltinha na minha lambreta



E deixa de pensar no tal Vilela



Que tem carro e barco à vela



O pai tem a mãe também



Que é tão tão sempre a preceito



Cá para mim no meu conceito



Se é tão tão e tem tem tem



Tem de ter algum defeito



 



Vem dar uma voltinha na minha lambreta



Vê só como é bonita



É vaidosa, a rodinha mais vistosa



Deixa um rasto de cometa



É baixinha mas depois



Parece feita para dois



Sem falar nos eteceteras



Que fazem de nós heróis



 



Eu sei que tem estilo gingão



Volta e meia vai ao chão quando faz de cavalinho



Mas depois passa-lhe a dor, endireita o guiador



E regressa de beicinho para o pé do seu amor



 



Vem dar uma voltinha na minha lambreta



Eu juro que eu guio devagarinho



Tu só tens de estar juntinho



Por razões de segurança



E se a estrada nos levar



Noite fora até mar



Paro na beira da esperança



Com a luzinha a alumiar



 



E deixa de pensar no tal Vilela



Que tem carro e barco à vela



O pai tem a mãe também



Que é tão tão sempre a preceito



Cá para mim no meu conceito



Se é tão tão e tem tem tem,



Tem que ter algum defeito



 



8) Flagrante



      Autores: Maria do Rosário Pedreira / António Zambujo



 



Bem te avisei, meu amor



Que não podia dar certo



E que era coisa de evitar



 



Como eu, devias supor



Que, com gente ali tão perto,



Alguém fosse reparar



 



Mas não! Fizeste beicinho



E como numa promessa,



Ficaste nua pra mim



 



Pedaço de mau caminho



Onde é que eu tinha a cabeça



Quando te disse que sim?



 



Embora tenhas jurado



Discreta permanecer



Já que não estávamos sós



 



Ouvindo na sala ao lado



Teus gemidos de prazer



Vieram saber de nós



 



Nem dei pelo que aconteceu



Mas mais veloz e mais esperta



Só te viram de raspão



 



A vergonha passei-a eu



Diante da porta aberta



Estava de calças na mão



 



9) Zorro



     Autores: João Gil / João Monge



 



Eu quero marcar um Z dentro do teu decote



Ser o teu Zorro de espada e capote



Pra te salvar à beirinha do fim



Depois, num volte face vestir os calções



Acreditar de novo nos papões



E adormecer contigo ao pé de mim



 



Eu quero ser para ti o camisola dez



Ter o Benfica todo nos meus pés



Marcar um ponto na tua atenção



Se assim faltar a festa na tua bancada



Eu faço a minha última jogada



E marco um golo com a minha mão



 



Eu quero passar contigo de braço dado



E a rua toda de olho arregalado



A perguntar como é que conseguiu



Eu puxo da humildade da minha pessoa



Digo da forma que menos magoa



“Foi fácil. Ela é que pediu!”



 



10) Barroco tropical



        Autores: José Eduardo Agualusa / Ricardo Cruz



 



O amor é inútil: luz das estrelas



A ninguém aquece ou ilumina



E se nos chama, a chama delas



Logo no céu lasso declina.



 



O amor é sem préstimo: clarão



Na tempestade, depressa se apaga



E é maior depois a escuridão,



Noite sem fim, vaga após vaga.



 



O amor a ninguém serve, e todavia



A ele regressamos, dia após dia



Cegos por seu fulgor, tontos de sede



Nos damos sem pudor em sua rede.



 



O amor é uma estação perigosa:



Rosa ocultando o espinho,



Espinho disfarçado de rosa,



A enganosa euforia do vinho.



 



11) Flintstones



       Autores: João Monge / Ricardo Cruz



 



Eu sei que cheguei tarde



Mas tenho uma explicação



Não passei na matilha



Não provei nem uma jola



Até colhi uma flor



Pra colher tua atenção



Eu juro que hoje não



Não pus o pé na argola



 



Trago marcas de batom



No casaco azul-marinho



Hoje foi dia da mãe



Passei lá para a beijar



Mas ela já não vê bem



Beijou-me o colarinho



Ela perguntou por ti



E acabei por me atrasar



 



Apanhei fila na ponte



Viste no telejornal?



Ainda te quis avisar



Mas dali não tinha rede



O destino às vezes faz



Partidas de Carnaval



Vá lá, tem pena de mim



Tenho fome e tenho sede



 



Eu sei que cheguei tarde



Estou meio-morto e com batom



Mas deixa-me explicar



O que foi essa hora morta



Não grites, por favor



Não faças subir o tom



Já está tudo a espreitar



Vá lá, Wilma, abre a porta



 



12) O tiro pela culatra



          Autor: Maria do Rosário Pedreira / Ricardo Cruz



 



Mal a vi, fui seduzido



Pelo seu corpo lança-chama



E a perna bem torneada.



E meti no meu sentido:



Se não a levo para a cama,



Não sou homem, não sou nada.



 



Pus um ar de matador



E assim, sem falinhas mansas,



Convidei-a para jantar.



Quase a vi ficar sem cor,



Mas, quando eu perdia as esperanças,



Aceitou sem hesitar.



 



Pronto para a grande conquista,



Barba feita, risca ao lado,



Sapato novo e brilhante,



Comprei rosas na florista



E cheguei adiantado



À porta do restaurante.



 



Quase me caía o queixo



E até fiquei aturdido



Com o choque da surpresa:



Ela, ao chegar, deu-me um beijo,



Apresentou-me o marido



E foi andando pra mesa.



 



13) O meu amor – Com Carminho (Até Pensei Que Fosse Minha – 2016)



      Autor: Chico Buarque



 



O meu amor tem um jeito manso que é só seu



E que me deixa louca quando me beija a boca



A minha pele toda fica arrepiada



E me beija com calma e fundo



Até minha alma se sentir beijada, ai



 



O meu amor tem um jeito manso que é só seu



Que rouba os meus sentidos, viola os meus ouvidos



Com tantos segredos lindos e indecentes



Depois brinca comigo



Ri do meu umbigo



E me crava os dentes, ai



 



As duas: Eu sou sua menina, viu?



E ele é o meu rapaz



Meu corpo é testemunha



Do bem que ele me faz



 



O meu amor tem um jeito manso que é só seu



De me deixar maluca quando me roça a nuca



E quase me machuca com a barba malfeita



E de pousar as coxas entre as minhas coxas



Quando ele se deita, ai



 



O meu amor tem um jeito manso que é só seu



De me fazer rodeios, de me beijar os seios



Me beijar o ventre e me deixar em brasa



Desfruta do meu corpo



Como se o meu corpo fosse a sua casa, ai



 



Eu sou sua menina, viu?



E ele é o meu rapaz



Meu corpo é testemunha



Do bem que ele me faz



 



14) Estranha forma da vida



          Autores: Amália Rodrigues / Alfredo Marceneiro



 



Foi por vontade de Deus



Que eu vivo nesta ansiedade



Que todos os ais são meus



Que é toda minha a saudade



Foi por vontade de Deus



 



Que estranha forma de vida



Tem este meu coração



Vive de vida perdida



Quem lhe daria o condão



Que estranha forma de vida



 



Coração independente



Coração que não comando



Vive perdido entre a gente



Teimosamente sangrando



Coração independente



 



Eu não te acompanho mais



Pára, deixa de bater



Se não sabes onde vais



Porque teimas em correr



Eu não te acompanho mais



 



Se não sabes onde vais



Porque teimas em correr



Eu não te acompanho mais


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